13.12.04

As "misérias" da medicina: Divergências Médicas, por Francisco Teixeira Mota

(...)o pano de fundo que envolve - e, de certo modo, explica - o conflito que opôs duas figuras respeitadas da medicina portuguesa deste século tem que ver com o diagnóstico e tratamento de uma fase crítica da grave doença de Salazar que viria a conduzir à sua morte física, depois de ter mergulhado o país numa crise política que culminaria com a sua substituição no cargo de presidente do Conselho de Ministros. As distintas descrições das circunstâncias de facto que rodearam os acontecimentos, acrescendo à crispação das relações profissionais - e pessoais - entre os professores intervenientes, foram factores determinantes da evolução litigiosa verificada (...)

Eduardo Coelho em seus apontamentos, publicados no defunto "O Jornal" em 1988, afirmava: "O dr. Vasconcelos Marques foi chamado por mim por eu ter feito o diagnóstico de hematoma intracraniano, subdural, e entender que era urgentíssima a intervenção cirúrgica. Fui eu que tive de assumir a responsabilidade do diagnóstico e da intervenção cirúrgica, por os neurocirurgiões presentes não concordarem com o diagnóstico, e fi-lo sempre na qualidade de médico assistente."

Vasconcelos Marques respondeu a tais afirmações com as afirmações que deram origem ao processo judicial que culminou com a decisão do Supremo.

Entre outras coisas afirmava Vasconcelos Marques no seu artigo de resposta, igualmente publicado em "O Jornal": "O depoimento do prof. Eduardo Coelho falseia toda a verdade"; "Em 5 de Setembro disse-me que não se tratava de qualquer urgência, era um doente que estava até muito bem"; "A 6 de Setembro, à tarde, disse-me que o dr. Salazar estava perfeitamente bem, tinha dado uma queda mas que tudo se resolvera"; "A partir desse momento só havia uma pessoa responsável - eu. Não tenho culpa que o sr. prof. Eduardo Coelho tenha chegado à idade a que chegou sem compreender que o único responsável dum acto cirúrgico é o cirurgião. Não entra na cabeça dum cirurgião digno desse nome ir operar um paciente à responsabilidade de um médico assistente"; "A partir daí começaram a surgir dificuldades por parte do prof. Eduardo Coelho, que entendia que o doente devia voltar para casa apesar de poderem surgir complicações. Eu não tomava a responsabilidade de lhe dar alta antes de, pelo menos, duas semanas"; "Sobre a sua isenção devo lembrar que uma tarde disparou-me '(...) assim que o sr. presidente do Conselho voltar para São Bento vai mandar fazer um Instituto de Cardiologia para mim (...)'"; "Decorridos oito dias (...), Salazar sentiu-se muito mal após o almoço (...) estava em situação desesperada, podendo morrer a qualquer momento. Dizem-me que o prof. Eduardo Coelho descreveu a Salazar a operação feita, seguramente com a perfeição que seria de esperar na descrição duma intervenção neurocirúrgica feita por um especialista em cardiologia"; "Se tenho aceite a sugestão do prof. Eduardo Coelho de ele ir para São Bento ao 4º dia de operado tinha morrido".

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[Eis um episódio da história da medicina portuguesa, que seria um "tesouro" nas mãos de um Fernando Namora]

2 Comments:

At 11:29 AM, Anonymous Anonymous said...

Sacha,

Ja que esta a discutir topicos relaionados com a medicina, e como medico que es, gostaria de ouvir a tua opiniao entre a relacao medicos e a industria farmaceutica.

Ja agora da um avista de olhos a este website: http://www.nofreelunch-uk.org/

Um abraco... e mais uma vez parabens pelo blog!
David
Oslo

 
At 1:30 PM, Blogger Sacha said...

Obrigado David, pelas frquentes visitas e pelas suguestões.

Devo dizer-te que este tema que me sugeriste ( medicina e a industria farmacêutica) é um tema que merecia não um mas vários textos. No entanto, confesso-te que (pelo menos por enquanto) não me sinto capaz de fazer uma análise interessante sobre o mesmo. É que muito do que se passa, percebe-se melhor com a experiência, e eu, como sabes ainda não tenho muita. Ainda assim, há já alguma tempo que ando para escrever um texto sobre a saúde e o estado, tendo como ponto de partida a questão da comparticipação no preço dos medicamentos. Vou ver se consigo introduzir aqui também algumas questões sobre a industria farmacêutica, embora preveja uma série de lugares comuns.

Vou visitar o site que me recomendaste. Um abraço.

 

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