12.4.05

Cabo-Verde na CE?

Germano Almeida é um conhecido escritor caboverdiano, talvez um dos mais conhecidos. Autor de obras como "O Testamento do Senhor Napumoceno da Silva Araújo" ou "As memórias de um espírito", este homem é também um reputado advogado.

Em declarações á RDP-África, Germano Almeida disse que Cabo Verde não pode pertencer á União Europeia porque "nós somos pretos", "não íamos ser considerados iguais" e ainda porque tal adesão significaria uma "humilhação".

Surpreendidos? Também eu.


Bazonga da Kilumba


Penso que antes de mais nada é preciso respeito. Germano de Almeida merece respeito. Penso ainda que Germano de Almeida está a falar com o coração cheio de romantismo, e nostalgia dos anos de idealismo nacionalista e pan-africanista. É preciso perceber o que ele diz e porque o diz. Mesmo não concordando com ele.

Sobre a hipótese de Cabo-Verde vir a aderir a Comunidade Europeia, devo dizer que já estava a espera deste tipo de reacção. Pensei é que seria limitada aos jovens estudantes Cabo-verdianos. Enganei-me.

Da minha experiência de convívio com amigos Cabo-verdianos muitas vezes noto que eles tentam ser "mais papistas que o papa" em relação a Africa. Muitos vezes ouço-os reclamar dos "preconceitos dos portugueses", da "mesquinhez portuguesa", do quanto "detestam viver em Portugal", da sua vontade de regressar, etc. Frequentemente segue-se a ladainha do costume sobre a beleza de africa, a riqueza da(s) culturas africana(s), o colonialismo ser a causa de todos os males de Africa, etc, etc

Não ponho em causa a legitimidade dessas reclamações e sentimentos, apenas constato que elas são mais frequentes e mais vivos por parte de Cabo-Verdianos do que da parte de Angolanos, Moçambicanos ou Guineenses. E faço a pergunta: Porquê? Porquê que os Angolanos, Moçambicanos e Guineenses não são tão afirmativos em relação a sua "africanidade"? A minha resposta é simples: porque não precisam.

Como resultado dessas conversas com Cabo-verdianos, fico muitas vezes com a ideia de que há uma difícil aceitação de algo, que, para mim, é uma constatação óbvia: A cultura portuguesa está firmemente presente nos aspectos identitários de Cabo-Verde. (basta pensar na língua e música nacional (crioulo e morna).

Sendo os Cabo-verdianos maioritariamente "crioulos" e sendo a sua cultura o resultado de uma mistura, esta atitude "hiper-africanista" surge justamente por “efeito de compensação” da sua "europeicidade”.

Ora, é preciso ir ao passado colonial e analisar o papel- alguma forma hegemónico- que o colonialismo atribuiu ao homem cabo-verdiano na Guiné e em Angola para se perceber o "Drama" dos os intelectuais nacionalistas Cabo-verdianos. E assim, acreditando que precisavam de se "redimir" e porque duvidavam que o resto de Africa os visse como plenos "irmãos africanos", precisaram de se mostrar "mais papistas que o papa". Possivelmente de forma inconsciente sentiram que tinham de "compensar" a sua cultura "europeia", a sua "pele mais clara", o facto de terem sido de certa forma os "protegidos" durante a época colonial. As novas gerações (que são os actuais estudantes cabo-verdianos em Portugal) cresceram e foram educados no meio deste complexo.

É assim que, sobre as afirmações de Germano de Almeida, digo o seguinte: percebo o seu idealismo, só que acho que é mais fácil ser-se idealista quando se tem o que comer. Em relação a vida das pessoas acho que as vezes é preferível ser prático.

Se eu tivesse nascido Cabo-verdiano na época colonial, ainda que pertencesse a uma elite, quero acreditar que teria também tido a coragem para participar, de alguma forma, na resistência e na luta de independência. Mas, nos tempos que correm, no ano 2005, não me importava nada que Cabo-Verde viesse a pertencer a comunidade europeia, se isso significasse a melhoria das condições de vida dos Cabo-verdianos. Até porque seria também benéfico para Africa e não significaria um afastamento nos laços de irmandade com Africa nomeadamente a lusófona
. Basta pensarmos, por exemplo, que, mesmo pertencendo a outro continente, são os brasileiros aqueles com que os angolanos se sentem mais irmanados

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