31.5.05

o que diz Cecil Taylor


I never understood how musicians could play music for poets and not read poems. I don't understand musicians who can play for dancers and not know how to dance. I mean, it's very interesting to me, you were talking about your research; well, one of the things--before I put words down, I probably have read a thousand words.(...)

if you have the opportunity to play for people all in different countries, one of the things you begin to discover is that people are--you can find oppressed people all over the world, therefore somewhere along the road you get the idea that it is certainly not about yourself. Any gift that you have is not about that at all. It's about a force that is about the ungiven, the uncreative. It is about the amorphous, and you are at best merely a vessel. And once you begin to understand that [laughs]--the wonderful thing about it is--I was thinking about it today--that the first time I heard Billie Holiday, I heard it in the room of a member of the family who was not very well thought of, and the other part of the family all liked Bing Crosby. And that was alright, but there is a qualitative difference. So in our small way what we attempt to do is to look and see and receive and become a sponge and attempt to make anything that exists as part of the palette to describe whatever it is we think we want to do. And what you want to do is to be as beautiful and as loving and as all-consuming as possible, so that the statement has many, many different implications, and it has many different levels. The only way to do that, seems to me, is to research.

extracto de uma entrevista de cecil taylor

30.5.05

Porque Festejam?

Alguém sabe qual foi o "Non" que ganhou?

Adenda:
(1)José Mário Silva, no BdEII: Na Praça da Bastilha, ontem à noite, a festa foi do NÃO. O NÃO de esquerda.
(2)Filipe Moura, no BdEII: O grande paradoxo está aqui: este tratado foi rejeitado com os votos da esquerda, mas eventualmente havendo outro - até pela mudança de governo que se afigura provável na Alemanha - será negociado pela direita, e será um tratado mais à direita. Talvez me engane - até porque o sinal político do "não" francês é claro. Mas a outra alternativa é mesmo não haver tratado nenhum. Em qualquer um destes casos - e graças aos votos da esquerda - o grande vencedor é o "não" de direita. Quem tem razões para comemorar são Blasfemos, Insurgentes e Pacheco Pereira. Os que estão satisfeitos com a actual ordem mundial. Os que não estão interessados no avanço do processo europeu.

29.5.05


Descansado os Olhos: Coming, Tatiana Kuznetsova.

(..)
Eu vi uma luz no fim do tunel,
Enchi de esperança o coração,
A luz que lá estava foi chegando,
Era um trem carregado de ilusão
(Marcio Faraco, Ciranda)

28.5.05

Ainda as entrevistas de Chacal

Há algum tempo, o poeta Bruno Tolentino levantou uma polêmica em torno da diferença entre letra de música e poesia. Na concepção dele, Caetano Veloso, por exemplo, não seria um poeta, mas um letrista. Como você vê essa questão

Tolentinices. O Bruno confunde poesia com poesia culta que tem como referência a própria poesia. A poesia que viaja com a música é meio vira-lata, vadia. Uma é poesia de língua. A outra, da fala. A poesia do Bruno tem que ter uma espinha dorsal como quer também João Cabral. Mas há muito a poesia vendeu as muletas da métrica e foi extrair ser ritmo da respiração entrecortada pelos sustos do imprevisto. Feliz do país que pode cantar seus poetas em alto e bom tom como aqui.

Os poetas da Poesia Concreta, de modo geral, sempre torceram o nariz
para a poesia dita “marginal”. E você, o que pensa da poesia concreta? E que avaliação faz dos poetas “marginais”?

Concretismo: dez em matemática. Dez em política. Zero em português.
Poesia marginal: zero em português. Dez em biologia. Zero em matemática


excerto das entrevistas na cronópios

O kota Chacal..

..tem um blog ( o chacalog) , mas..."what´s up with the colors?".


Atitude voluntariamente marginal. Dono de uma linguagem esperta , não fácil. Linguagem de rua. Que busca o tiro certeiro. Eis Chacal, poeta brasileiro.

Chacal.

Como você viu e viveu as transformações (se é que houve alguma) das décadas de 70, 80 e a atual.
É divertido falar disso, estando dentro da parada. Mudam os anos, os modos, o país, mudo eu. 70 foi um período sinistro, vertiginoso, cercado de treva e droga. Mas no meio algo brilhava: a luz negra dos poetas possessos. E a voz penetrou o silêncio imposto e fertilizou a poesia. 70 foram anos “punk”, de uma poesia urgente, mal acabada, irresistível, vital. A poesia olhava a vida nos olhos e dizia como era ela e vice-versa.
A torre de marfim, atingida pelo raio da vida, ruiu boquiaberta. E desses escombros, brotou o rock dos 80. Os poetas migraram para a música porque o som distorcido e amplificado das caixas de som eram as caixas de guerra que eles precisavam. A tecnologia veio junto com a indústria cultural. A poesia se performatizou, se profissionalizou, aprendeu os truques marqueteiros e aprofundou suas olheiras com maquiagem barata.
Nos 80, os poetas invadem os palcos, armados de guitarras até os dentes. Nas garagens da poesia, o verso era recauchutado. Cientistas do verbo, exasperados com tanto barulho e diluições, recuperavam o vigor do verso, a coluna vertebral do poema era estimulada como antídoto aos maus modos marginais. E chega 90 com seu jeito collorido. A biodiversidade campeia. A indústria drenou a alma do rock e partiu para o interior. As editoras deixaram o barco bêbado da poesia à deriva e os poetas acordaram. Dos laboratórios das faculdades de letras, veio à luz um verso novo, eivado de referências poéticas.
A poesia, cansada de lidar com a vida, de brigar para mudar o mundo, se volta para dentro de si mesma. Os cadernos de cultura exultam. As referências agora são mais fáceis de achar. Saem das ruas e vão para as bibliotecas e livrarias. Mas a contraparte dessa tendência estoura nas rádios e se chama rap, hip-hop, funk. A poesia falada, cantada no ritmo eletrônico, celebrando a miséria urbana. Final de milênio. Vale tudo que venha somar. Radicalmente.

Três antigas entrevistas de Chacal, agora disponíveis
aqui, na Cronópios


Cosmogónicos (masks I-III), Dilo Mutima, 1997

Enquanto espero que a National Genographic
Aprecie o meu genoma e me diga de onde vim.
Deixo os ténis que trago confirmarem que sou chic
Ando, como toda a gente, à procura de mim

26.5.05


Momentum: expandindo os caminhos de Elastic

O momento elástico de Joshua Redman e do SF JAZZ Collective

Joshua Redman mudou-se da WB para a nonesutch e já tem um novo disco.

Momentum é um álbum que prossegue na senda da eléctricidade orgânica do álbum anterior – o brilhante, Elastic de 2002 – ou seja, na via que o próprio Redman chama de “electric, groove-based thing”. O núcleo de acompanhantes é o mesmo, ou seja Sam Yahel e Brian Blade que surgem agora oficialmente designados como The Joshua Redman Elastic Band.

Só que, desta vez, a paleta sonora não se restringe aos saxofones de Redman, a bateria de Blade e ao órgão, piano, teclados e efeitos de Sam Yahel. Além de Jeff Ballard – que, como já tinha acontecido nos concertos ao vivo, substitui o super ocupado Brian Blade – o disco conta ainda com as participações do vibrafonista Stefon Harris, do trompetista Nicholas Payton, e de um verdadeiro all-star de jovens guitarristas: Peter Bernstein (com quem Joshua já tinha trabalhado em freedom in the groove), Eric Krasno (dos Soul Live), Jeff Parker e Kurt Rosenwinkel.

Mas Redman não se quis ficar por aqui e convidou músicos vindos de outros estilos: Flea, baixista dos Red Hot Chili Peppers participa em três faixas, Me’shell N’Degeocello também toca baixo numa e ?uestlove, baterista dos The Roots, noutra.

Da audição dos samples, deu para reconhecer alguns temas que já eram tocados nas performances ao vivo. É o caso do fabuloso Sweet Nasty

O Álbum é produzido por Joshua Redman e Sam Yahel.

---«»----
Ao mesmo tempo a nonesuch lançou o primeiro álbum do SF (São Francisco) Jazz Collective. O álbum recolhe o melhor das performances ao vivo do colectivo, que em 2004 andou pela área de São Francisco e outros pontos da Califórnia.

Além de Joshua Redman, nessa altura o SF Jazz Collective eram: o vibrafonista Bobby Hutcherson, o saxofonista , o Miguel Zenón, o trompetista Nicholas Payton, a pianista Renee Rosnes, o trombonista Josh Roseman, o baixista Robert Hurst e Brian Blade, o baterista. O álbum contém 10 temas, três são de Ornette Coleman – que foi, em 2004, o compositor homenageado na primeira parte dos concertos do colectivo – e os restantes, são de Hutcherson, Zenón, Redman e Rosnes. Um de cada um.

Mais sobre estes discos no site de
Joshua Redman e no da nonesuch records

De momento, enquanto o "momentum" não chega cá, vou preparando os ouvidos com Elastic

25.5.05

Urgência Filosófica

Médico: o quê que se passa?

Doente: Estava a lavar o carro, tinha sede, não sabia, bebi água de bateria.

Médico (assustado): Bebeu O QUÊ?! Sr.ª enfermeira, enquanto eu ligo para a gastrenterologia, canalize uma veia deste senhor, ponha-lhe um soro a correr.

Doente (fugindo aos gritos): O quê? querem-me dar soro filosófico? Não quero. SORO FILOSÓFICO NÃO!
------:-:---------
------:-:---------
Epílogo: O Doente acabou internado na psiquiatria. Foi considerado louco por recusar aquilo que o mundo inteiro anda à procura: o soro filosófico.

feiras paralelas

Hoje, em Lisboa começa a feira do livro.

No Rio, entre 13 e 22 de Maio houve a bienal do livro. Aqui, um resumo do que lá se passou e algumas entrevistas interessantes.

Entretanto, ao fazer clicking por esses links, descobri o paralelos;. Confesso que não conhecia.

24.5.05

E-clair


4 Girls, Easter Sunday; William Klein; 1955

Directamente da barra dos «comments» para a caixa de «contributors», a E-clair já chegou. Bem-vinda!

A culpa é do Bloco, pá

O Jorge Coelho e o PS estão chocados e estupefactos com o valor do défice e deixa críticas ao anterior executivo, chegando a classificar as acções destes como irresponsáveis.

O PSD diz, através da agridoce voz de Dulce Franco, que o número não surpreende, a culpa é toda de Guterres e do PS, e acrescenta que se não fosse o governo do (PPD)-PSD-(CDS)-PP o valor ainda seria muito pior.

O Abre-Surdo não gosta nada de ver irmãos as turras e por isso, resolvemos ilibá-los da paternidade do macrossómico bebé.

A culpa só pode ser da esquerda,pá. É tão óbvio que não sei como ninguém se lembrou.

Reparem bem: O problema começou com o segundo governo de Guterres, certo? Ora, qual foi a grande novidade parlamentar nessas eleições? Resposta: A eleição dos deputados Louçã e Fazenda, pelo BE.

Acham que não basta? querem melhor prova de que a culpa é do Bloco? Então atentem no que se seguiu:

Veio «o pântano» e, como os pântanos são locais húmidos e quentes, foi preciso o país despir-se: novas eleições já com a «tanga» bem vestidinha. E o que foi que aconteceu? Mais um duro golpe para as finanças públicas: O Bloco ganhou mais um deputado.


Mesmo com o leite azedado, com país em hipoglicémia, não houve solução: Quem era félix, agora entristecia porque o défice, apesar da maquilhagem, continuava a acumular adiposidades.

A sentença é clara: O Bloco é o culpado.


Ah, e o PCP também, claro: Ninguém se pode esquecer que o PREC é filho do PCP, e, como é sabido, o PREC está na genealogia de todos os problemas do país pelo que não pode deixar de ser também responsabilizado pelo défice. Ainda que passem cem anos, a culpa será sempre do PREC.

O PREC é a mãe, o Bloco é o pai e o PCP - que é hermafrodita, repare-se como conseguiu sozinho conceber, ainda que involuntariamente, a "renovação comunista" - é o avô e a avó do défice.

O outros partidos, coitados, apenas são muito generosos e, como têm vivido alternadamente naquela casa muito grande chamada Governo, acordaram em adoptar e dar um pouco de educação a criança gulosa e mal comportada.

Está tudo explicado.

Se o Joaquim dos assuntos económicos da Europa nos vier chatear, como anda a fazer a Itália, a malta impege-lhe a verdade dos factos e pronto, pá. É da maneira que mandam para cá a NATO, para nos livrar da «extrema-esquerda radical.»

22.5.05


Time Slave, John Parnell

...dentro ou fora da maquina do tempo

Os europeus e os africanos têm noções do tempo completamente distintas. A percepção que têm do tempo é diferente, assim como é diferente a relação que com ele mantêm. O europeu está convencido que o tempo tem uma existência exterior a ele próprio, uma existência objectiva e com uma natureza mensurável e linear. Para Newton o tempo era absoluto: «O tempo absoluto, real e matemático flui em si e na sua natureza uniformemente, sem relação com nada que lhe seja exterior…» O europeu vê-se a si próprio como uma escravo do tempo, está dependente dele, é-lhe submisso. Para poder existir e funcionar tem de respeitar as suas leis férreas imutáveis, as suas regras e princípios flexíveis. Tem de respeitar prazos, datas, dias e horas. Move-se dentro da máquina do tempo, não pode existir fora dela. Esta máquina impõe-lhe as suas obrigações, exigências e normas. Entre o homem e o tempo paira um conflito irresolúvel, que termina sempre com a derrota do homem – o tempo destrói-o.

(Para o africano) o tempo torna-se perceptível como consequência das nossas acções e desaparece quando deixamos de fazer alguma coisa ou não fazemos absolutamente nada. O tempo é uma matéria que pode, sob influência nossa, ser constantemente animada de vida, que mergulha, contudo num estado de sono profundo ou de não-existência, mal abdicamos da nossa energia. O tempo é uma categoria passiva e sobretudo dependente do homem.

Uma inversão completa do pensamento europeu.

Passando da teoria à prática: quando chegamos a uma aldeia na qual vai haver um reunião durante a tarde, e não encontramos ninguém no local do encontro não vale a pena perguntar: «quando é que a reunião começa?» A resposta é, pois já sobejamente conhecida: «quando todos estiverem presentes.»

(…)
Algures neste mundo circula e flui uma energia misteriosa que, quando se aproxima de nós nos preenche, nos dá força suficiente para colocar o tempo em movimento – há algo que se inicia. Mas, quando isso não acontece, somos obrigados a esperar – qualquer outro tipo de comportamento seria inútil e representaria uma atitude quixotesca
.

Ryszard Kapuscinski, Ébano.
Edição Campo das letras, 2001.
(tradução de Maria Joana Guimarães)
Alguém percebe polaco? eis aqui o seu site

bom, razoável e mau

Bom

O blog Pululu faz um ano. O Kota Lubitango ( Eugénio de Almeida) está sempre atento ao que se passa em África e nos países lusófonos.

Costumo comentar no Pululu com alguma assiduidade, umas vezes concordando e outras discordando, que é assim que deve ser quando o que nos move são as ideias.

Está de parabéns


Razoável
Pelo mesmo Pululu soube da disponibilidade on line de um novo jornal de notícias angolanas. É o
Luandadigital. Tem uma aparência gráfica simples mas eficiente e parece ter um critério editorial diferente do AngolaPress e do Angonotícias.

Mau
Entretanto, o Angonotícias, para meu espanto, que devo ser muito ingénuo, aceitou, publicar e albergar um artigo para o qual não consigo encontrar outras palavras senão simplesmente chamar-lhe lixo. O "articulista" (que não assina, provavelmente porque tem uma vaga ideia da sua imbecil nulidade) destila alarvemente os seus preconceitos e orgulha-se da ignorância misturando olhos com bugalhos numa atrapalhação argumentativa patética e ridícula e absurda. A única utilidade possível deste artigo seria como inspiração para um sketch humorístico. Mau de mais para ser verdade.

Volto a perguntar : quais são critérios editorias de quem aceita publicar uma porcaria destas?

20.5.05

As vozes correctas do politicamente incorrecto.

Hoje em dia, dizer que alguém é politicamente correcto significa
(1) que essa pessoa ou não pensa e apenas segue o rebanho ou
(2) que até pensa mas não diz o que realmente pensa e portanto é hipócrita.

Essa é a definição veiculada pelas "vozes correctas do politicamente incorrecto".

"Incorformismo perante a cultura dominante e o politicamente correcto."

Este tipo de mensagem já se tornou familiar. Vem da direita. Da neoliberal que aspira - para poder ganhar força - associar-se a uma imagem de juventude e rebeldia.

Em sob as pedras da calçada,...nada , Miguel Vale de Almeida desmonta um por um os suspostos pressuspostos contidos nessa frase.


Lendo ao Sol, Jorge Henrique

...ainda o "Homem Velho"


old man shading his eyes with his hand, Rembrandt (1639)

O meu fim evidente era atar as duas pontas da vida e restaurar na velhice a adolescência. Pois, senhor, não consegui recompor o que foi nem o que fui. Em tudo, se o rosto é igual, a fisionomia é diferente. Se só me faltassem os outros, vá, um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mas falto eu mesmo, e essa lacuna é tudo. (…)

Entretanto, vida diferente não quer dizer pior; é outra coisa. A certos respeitos, aquela vida antiga aparece-me descabida de muitos encantos que lhe achei; mas é também exacto que perdeu muito do espinho que a fez molesta, e , de memória, conservo alguma recordação doce e feiticeira. Em verdade, pouco apareço e menos falo. Distracções raras. O mais do tempo é gasto em hortar, jardinar, ler; como bem e não durmo mal.

Dom Casmurro, Machado de Assis, (1900)

O não e o sim à Constituição Europeia

A opinião sobre o referendo à constituição europeia sempre esteve presente na blogosfera. Mas faltava um centro - dois, para ser exacto - onde o "não" e o "sim" ganhassem síntese. Agora já os temos: O Sítio do Não ( criado por Pacheco Pereira) e o Sítio do Sim.

Esperemos que não fiquem limitados a blogosfera onde há sempre debate, mas em geral ninguém convence ninguém de nada porque todos têm muitas certezas e raramente se enganam.

Quem achar que (ainda) não tem uma clara noção do que está em causa, tem, nestes dois "sítios", um bom instrumento para iniciar o seu esclarecimento. Informemo-nos, esclareçamo-nos e meditemos. Quando chegar o dia de votar, votemos. Assim, por essa ordem e não por outra qualquer, inversa ou diferente.

Quem acha que "já está informado", "não tem dúvidas", ou que, tendo-as, vai "votar como defende o seu partido e pronto" pode ir à praia, ir ver o episódio final da guerra das estrelas, ir ver estrelas ao observatório nacional de astronomia, assistir a série Barbosa do Gato Fedorento, ou qualquer outra coisa.

Depois, no dia do referendo, que cada um se orgulhe do seu esclarecido exercício de cidadania.

17.5.05


"José Eloi" foto de Marcinho Lima

Homem Velho

O homem velho deixa a vida e morte para trás
Cabeça a prumo segue rumo e nunca, nunca mais
O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais
O homem velho é o rei dos animais


A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol
As linhas do destino nas mãos a mão apagou
Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll
As coisas migram e ele serve de farol


A carne, a arte arde, a tarde cai
No abismo das esquinas
A brisa leve trás o odor fugaz
Do sexo das meninas

Luz fria, seus cabelos têm tristeza de neon
Belezas, dores e alegrias passam sem um som
Eu vejo o homem velho rindo numa curva do caminho de Hebron
E ao seu olhar tudo que é cor muda de tom

Os filhos, filmes, livros, ditos como um vendaval
Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal
Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual
Já tem coragem de saber que é imortal

Caetano Veloso

15.5.05

Pat de volta a Portugal


Quem vai estar por cá, mais uma vez é o Pat Metheny Group. Em Junho, no dia 25 no Coliseu do Porto e dia 26 no Coliseu de Lisboa.

Os concertos de Pat Metheny custumam ser um evento único. O homem nunca faz fretes. Proporciona-nos duas horas e meia- estou a falar a sério! - de música. Tocando sozinho, com o grupo completo ou com alguns membros. E sempre com aquele sorriso humilde nos lábios. Como se todas as noites se espantasse com a sorte que tem: enorme talento, um veículo para expor esse talento e imensa gente que reconhece e se interessa pelo faz.

Quem nunca o assistiu aos seus concertos, deverá, se puder ir a este. Com certeza não se arrependerá. Quem já o viu, provavelmente sente-se tentado a repetir a experiência
.

Anticorpo Musical: Antipop



Pop é a normalização de todas as estéticas.

Na pop não se é músico, compositor, guitarrista, cantor ou dançarino, é-se “entertainer”. A pop não é arte e entretenimento.

É uma espécie de macrófago de plasticina, molda-se a tudo, mas tudo engole, destruindo.
Tem por isso toda a lógica que o designado rei da pop seja esse indescritível freak chamado Michael Jackson.

É obvio que há gente muito talentosa no mundo pop. Muitos cansam-se e - temporária ou irreversivelmente - abandonam-na. Mas os que nela entram tardiamente, raramente recuperam. Tornam-se seus prisioneiros.

Alguns exemplos:
-Em determinada altura previa-se que George Benson viesse a ser um novo Wes Montgomery. Só que o homem não quis ficar preso no “"guetto jazzístico"”. Quis ser maior, quis ser pop. George Benson virou ….... um "Michael Jackson da Guitarra". Com direito a plástica ao nariz e tudo.

-O diapasão do reggae devia ser Bob Marley mas, na pop, a bitolapassa a ser UB40 tocando versões reggae de antigos hits de outros. O que vira por sua vez um novo o álbum de greatest hits dos UB40. É depois poderá um dia ser versões tecno das versões reggae que os UB40 gravaram de musicas de outros.É isto a pop: reciclagem.

Stevie Wonder tornou-se reconhecido e admirado fazendo discos geniais como "Visions" ou "Songs in the Key of Life". Chegou a pop e limitou-se a cantar pateticamente “" I´ve just called to say I love you"”, enquanto, em palco, segurava um telefone vermelho de plástico com um microfone embutido. (já agora quem foi o pseudo-coreógrafo responsável por este assassinato? Gostava de trocar uma palavrinhas com ele). Stevie é um tipo porreiro. Tão porreiro até aparece a apoiar patifes que facturam milhões destruindo músicas suas.

Finalmente o Hip-Hop : uma cultura um movimento urbano interessantíssimo e genuíno, que chegou a ser representado por grupos como: De la soul, Arrested Development, Tribe Called Quest. Chegou a pop, naturalmente virou Hip-pop: foi normalizado em Eminems, Snoops, 50 Cents e Dr.Dres.

“"All about the Money".”

13.5.05

Alto comissário para os refugiados

O "Pedra do Homem" descobriu a "verdadeira" razão pela qual Guterres e mais quatro candidatos andam tão interessados no cargo. Ora vejam lá.

Ainda a respeito do talvez futuro alto comissário para os refugiados, lembrei-me dos versos de cacaso para a música Canudos de Edu Lobo. Digam lá se não foi feita à medida:

Entre Rios, Belos Montes
Quem é esse que vagueia
Conselheiro que tonteia
E apeia sem chegar

Que horizonte mais errante
Que crendice mais descrente
Que descrença mais distante
Que distancia mais presente

Quando o céu virasse a terra
Como um rio sem nascente
Quando a espada entrar na pedra
Quando o mar virar afluente

Que paixão insatisfeita
Que vingança mais demente
Virgem Santa decaída
Satanás omnipotente

Entre rios, belos montes
Desgoverno governante
Quanto gente confiante
Em António, o penitente

12.5.05

Uma nota sobre abates de sobreiros

Independentemente da evolução e conclusões da investigação, o simples facto do negócio - que era no mínimo "sensível" - ter sido aprovado, já com o governo demitido e em vésperas de eleições, diz muito sobre a ética e a maneira de estar na política dos políticos implicados.

E o que é facto é que muitas outras medidas e decisões foram tomadas já em vésperas de eleições. Nas mais diversas áreas. Muitas vezes à revelia de meses e meses de conversações com os parceiros. Estamos perante aquilo que os brasileiros chamam de"crocodilagem".


Adenda:
- Artigo de opinião, a ler: Faz falta higiene na política, por António José Teixiera.
- Parece que afinal a história ainda é pior. O expresso e o DN dizem que os ex-ministros (Nobre Guedes e e Telmo Correio assinaram os despachos já depois das eleições.
- Vicente Jorge Silva no DN, a respeito da tal questão ética.
- Já agora, também este de Luís Miguel Viana

Umberto Eco: Sobre o espectáculo desportivo


Pelé, Patrick Lichfield, 2003

Do jogo.

Domina a actividade desportiva a ideia do desperdício

(...…)

Ora este desperdício - que fique bem claro - é profundamente são. É o desperdício próprio do jogo. E o homem, como todo o animal, tem a necessidade física e psíquica de jogar.Há portanto, um desperdício lúdico ao qual não podemos renunciar: exercitá-lo significa ser-se livre e libertar-se da tirania do trabalho indispensável. Se ao pé de mim, que arremesso a pedra, um outro se junta para arremessar ainda mais longe, o jogo toma a forma de competição.

Da competição
Também ela é um desperdício: de energia física e de inteligência (…...) mas este desperdício lúdico resolve-se num ganho (...…) as competições desenvolvem e controlam a competitividade, reconduzem a agressividade originária a sistema, a força bruta a inteligência.

Mas já nestas definições se aninha o caruncho que mina o gesto nas raízes: a competição disciplina e neutraliza as forças da praxis. Reduz um excesso de acção, mas de facto é um mecanismo para neutralizar a acção.

Do espectáculo desportivo
Deste núcleo de equívoca sanidade (...…) amadurecem as primeiras degenerações da competição: com a criação de seres humanos votados a competição. O atleta é já um ser que hipertrofiou um único órgão, que faz do seu corpo a sede e a nascente exclusiva de um jogo contínuo: o atleta é um monstro (…...) É a geisha de pé, comprimido e atrofiado, votada à instrumentalização total.

Mas o atleta como monstro, nasce no momento em que o desporto é elevado ao quadrado: isto é, quando o desporto, de jogo que era jogado na primeira pessoa, se torna numa espécie de discurso sobre o jogo, ou melhor o jogo como espectáculo para outros (...…) o desperdício ao quadrado é o espectáculo desportivo.

Se o desporto praticado é saúde, o desporto visto é a mistificação da saúde. Quando vejo os outros jogarem não faço nada de são, e apenas vagamente me deleito com a sanidade alheia (...…)

Claro que quem vê o desporto praticado pelos outros se excita: e grita e mexe-se e por isso faz exercício físico e psíquico e reduz a agressividade e disciplina a competitividade. Mas esta redução não é compensada pela, como ao fazer desporto, por um acréscimo de energias e por um adquirido controle e domínio sobre si.
(...…)


Os elementos de disciplinamento da competitividade , que no desporto praticado tinha os dois rostos do acrescentamento e da perda da humanidade, no voyeurismo desportivo tem só um, o negativo. O desporto apresenta-se então, como foi durante séculos, qual instrumentum regni. São coisa obvias: os circenses põem travão às energias incontroláveis da multidão.

Mas este desporto ao quadrado(…...) gera um desporto ao cubo, que é o discurso sobre o desporto enquanto visto.

(continua...)

Umberto Eco, Conversa Desportiva, (1969)
in Viagem na Irrealidade Quotidiana.


9.5.05

Certas Canções

Como resultado do que a Ana escreveu nos comentários do post anterior, lembrei-me da música "certas canções"(parceria entre Tunai e Milton Nascimento, com versos do último)

Certas canções que ouço
Cabem tão dentro de mim
Que perguntar carece
Como não fui eu que fiz

Certa emoção me alcança
Corta minha alma sem dor
Certas canções me chegam
Como se fosse o amor

Contos da água e do fogo
Cacos de vidas no chão
Cartas do sonho do povo
E o coração do cantor…

Vida e mais vida ou ferida
Chuva, outono ou mar
Carvão e giz abrigo
Gesto molhado no olhar…

8.5.05

Ouvindo Sabiá.


O Cuanza desaguando no Atlântico

Entre obrigações emprestadas e necessidades sentidas, vou adicionando nostalgia neste domingo adomingado, enquanto ouiço Sabiá.

Aqui fica o poema de Chico para uma das mais bonitas música de Tom:

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Vou deitar à sombra
De um palmeira
Que já não há
Colher a flor
Que já não dá
E algum amor
Talvez possa espantar
As noites que eu não queira
E anunciar o dia

Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Não vai ser em vão
Que fiz tantos planos
De me enganar
Como fiz enganos
De me encontrar
Como fiz estradas
De me perder
Fiz de tudo e nada
De te esquecer

Anticorpo musical: DJ´s



Um DJ é um músico?
Se eu pegar em três quadros de três pintores, cortar cada um deles em quatro e depois colar ao meu gosto os doze pedaços numa nova tela, igualo-me aos três pintores?

Anticorpo Musical: Uma questão de RAM?



Quando vejo algumas pessoas torcerem o nariz a algumas das ideias musicais mais audaciosas, lembro-me sempre da cena do filme Amadeus: “sua alteza” explica a Mozart a razão pela qual tinha achado que a última opera deste: -Belmonte und Constanze- estava longe de ser perfeita: "“too many notes”"

-Não gosta? Notas a mais? Que tal retirando algumas?

6.5.05

O Major e a Shô tora


(Orange Fish Lost, Travis A.Louie)


- Boa noite, major
- Oh shô tora
- Oh major
-OH Shô Tora
- Major!!!!!!
-SHÔ Tora!!!!!!!

(silêncio curto)

-major, o que pen
- … Hum, hã, não é por mim sabe…. E pelos clubes profissionais. E eles estão de acordo. É melhor eu ficar mais um ano.
- Mas Major….
- Oh Shô tora,
- Major…
- Oh Shô tora

(outro silêncio)

- Major, não ach
- Podia ter sido diferente, sabe. Não, não é por mim, mas pela posição que ocupo. É que nós somos todos iguais perante a justiça, mas a justiça não é igual para todos…Se eu fosse major no activo tinham-me tratado de maneira diferente, se eu fosse Magistrado também…É como eu digo, nós somos iguais perante a justiça mas a justiça não é igual para todos
- Mas major está a dizer que...
-Oh shô tora!
- Major isso quer di
-Oh Shô tora, Pois é! Pois é! O Pinto da Costa foi tratado de maneira já diferente. Acho bem, a policia judiciária evoluiu. Acho bem.
- Mas major ….
- Oh Shô tora, não vou por aí
- De qualquer manei
-Oh Shô tora, quer dizer, a juíza disse que eu não podia falar com o Pinto da Costa. Mas ele podia falar comigo. Ora isso era ele ser activo e eu passivo. Hum, ah... uma coisa tipo homem, mulher. Isso não podia dar certo e eu, hum, bem….enfim, é melhor não ir por aí…

(mais um curto silencio)

-Major, mudemos de assunto….quanto a
- Ah, disso não quero falar...
- Mas o major disse ont
- É melhor não falar...
- Mas pensa q
- Gondomar? Oh shô tora, quanto a Gondomar, não posso fazer nada. São os gondomarenses que me querem. Tá a perceber? O Dr. marques Mendes faça o que entender. Mas eu não posso deixar de ser candidato. Estabeleceu-se uma relação. Uma relação, está a perceber? Entre mim e os gondomarenses e entre os gondomarenses e mim. Uma relação que eu não posso quebrar. Porque eu nunca falto a palavra. Eu não minto nunca. O major não mente.
- Mas, e a
- A comissão política? Olhe isso nem sei. Liguei para o hum, hã? Como é mesmo o nome dele? Não me recordo, aquele que fui eu que nomeei quando eu era presidente da distrital e que foi o único que o Durão Barroso manteve porque tinha sido eu que o tinha nomeado. Foi aliás o próprio Durão que me disse, pode-lhe perguntar e foi então que.... Bem... onde é que eu ia?
- Sobre Gon…
- Ah Pois! A comissão política também não sabe nada. Mas os Gondomarenses sabem. Eles é que sabem.
- Mas
- Oh Shô Tora, eu não deixarei de ser do PSD. Eles que me castiguem, já não seria a primeira vez. Mas viva o PSD! O nosso partido, o nosso part… quer dizer, o meu partido.
- Obrigado, major por esta entrevista.
- Ora isto não foi uma entrevista, foi uma conversa. Obrigado Shô tora por me considerar digno de ser seu convidado. Gostei muito desta conversa.

(Já Off-line: Oh Shô tora, puxa quase que não me deixava falar. no meio de tanta pergunta quse que eu não tinha tempo para responder a nenhuma. Estou a precisar de retemperar da garganta. Olhe, já agora diga-me, onde é que posso comer um caldinho de cherne ou uma sopinha de tomate bem quentinha? )


nota: Qualquer semelhança com a surrealidade real não é mera irrealidade.

5.5.05

Anticorpo Musical: Anti -"Hard/Metal Rock"

Cobra Branca”,“Leopardo Surdo”,“Pistolas e Rosas”, “Escorpiões”, “ Veneno”,“ Mega Morte” e “Sepultura

Uma coisa podemos dizer em sua defesa: Não é por falta de aviso, Elogiemos-lhes a honestidade.

Anticorpo Musical Anti-“Smooth” Jazz

Muitas das boas editoras de Jazz têm-se debatido desde sempre com dificuldades de sobrevivência decorrentes da sua viabilidade comercial.

Muitas desapareceram, outras tornaram-se meros “catálogos” de outras editoras maiores.

Aquela que praticamente inventou o Smooth Jazz e por isso a única que merecia desaparecer completamente do "mapa", vai, sob a asa da Verve, sobrevivendo: A
GRP, uma espécie de Margarida Rebelo Pinto das editoras de jazz.

Anticorpo musical: Anti-Kenny G, pt2

George Benson, Earl Klugh, Gerald Albright, Dave Grusin, Lee Ritenour, Al Jarreau, são músicos de “Smooth”-Jazz

O Kenny G é mesmo só “Smooth” .

Anticorpo musical: Anti Kenny G



Há quem diga que sou irascível.
Não concordo, embora admita que às vezes o meu fígado se mostra célere na secreção de bílis. Por exemplo, quando dou de caras com Cêdês do Kenny G na secção de Jazz.

Loja que cometa esse sacrilégio, pode contar que acabou de perder um cliente. Para sempre.

"...strangeness seems so beautiful"



If we think of women living in Africa, we often have in mind thought-fragments like "suppression of women", "circumcision of girls", "poverty" and so on. We seldom think of intelligent, modern women that are aware of their history and their personal interests. One woman that stands for the "New Africa" is Sally Nyolo. She has self-confidence, knows what she wants, is full of courage and never looses her own aims out of sight

In her songs we are told about the stories of old and young women in Cameroon. She herself presents a singing-technique and a music, that in its strangeness seems so beautiful and electrifying to us that it is going on and on in our minds.

Carina Prange

uma curta entrevista, aqui, na JazzDimensions

Sally Nyolo



Sally Nyolo has an African-European background, she is born in Southern Cameroon, but has lived in Paris since she was thirteen. She started her career as a backing singer for other artists, among them Touré Kunda. In 1993 she started her own group and performed in Paris. In that same year, she sang at the WOMAD Festival in England and her performance won her a place on a compilation released by Peter Gabriel's Real World label. She then became a member of a female vocal group Zap Mama. She is singing on their first two disks. She was the first of the Zap Mama girls to go solo. From Paris she built up her own career and has now released four albums under her own name. Sally Nyolo has taken the a capella based song style of Zap Mama in another direction.

Where Zap Mama eventually went down the more rock influenced road, Sally has returned to her roots and adopted the old rhythms of her homeland of Cameroon.



Dessas coisas que por aí andam: do "referendo" à "necessidade de importação de médicos", do que vai fazendo notícia, ao que estranhamente vai sendo ignorado,de todo isso, um dia destes vou ter de arranjar um tempinho para mandar as minhas bocas.

Mas agora não.
Agora tiro 10 minutos para ouvir duas músicas de Sally Nyolo e procurar saber um pouco - apenas aquelas coisas que podem ser escritas - sobre essa cantora, intrigante mulher.